segunda-feira, 25 de fevereiro de 2008

Trabalhadores da ex-DGV nos excedentários quando há milhares de multas ao abandono


Público, 25 de Fevereiro 2008

A extinção da Direcção-Geral de Viação pode atirar mais de 140 trabalhadores afectos às contra-ordenações para a mobilidade especial. Sindicatos contestam e avançam para tribunal

Há nove meses que a reorganização da ex-Direcção-Geral de Viação (DGV) deixou ao abandono milhares de multas de trânsito nas antigas instalações regionais daquele organismo, agravando-se o risco de prescrição das contra-ordenações rodoviárias. Ao mesmo tempo, mais de 140 trabalhadores da antiga DGV deverão passar para a mobilidade especial, apesar de o instituto que lhe sucedeu contratar desempregados dos programas ocupacionais e empresas de outsourcing para tratar dos processos.

A situação confusa que se gerou com a cisão da DGV - relatada ao PÚBLICO por funcionários que pediram o anonimato - abrange não só o tratamento das multas como a descoordenação entre os sistemas informáticos relativos às infracções e a condutores.
Na Primavera de 2007, o Governo extinguiu a DGV e criou dois novos organismos: a Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária (para tratar das contra-ordenações de trânsito) e o Instituto da Mobilidade e dos Transportes Terrestres (IMTT), que integra outros organismos do Ministério das Obras Públicas para tratar da área de veículos e escolas de condução. A ANSR funciona só em Lisboa e o instituto ocupou então as delegações regionais da antiga DGV.

Há um número desconhecido - mas que deve ascender aos milhares - de processos de contra-ordenações que ainda não foram recolhidos pela ANSR e que estão armazenados nas delegações regionais do IMTT sem que ninguém lhes possa tocar, já que os funcionários deixaram de ter essa competência desde Maio de 2007. Em Lisboa, na sede da ANSR, acumulam-se os processos, existindo o risco de prescreverem 20 mil contra-ordenações de trânsito, como alertou recentemente o deputado do PCP, Bruno Dias. Contactada pelo PÚBLICO, a ANSR informa que o balanço de processamento das contra-ordenações será feito "oportunamente".

Descoordenação geral

A situação vivida hoje é completamente diferente do espírito que presidiu à reforma de toda esta área. No preâmbulo do decreto-lei que criou a ANSR, sublinhava-se que a centralização em Lisboa visava reforçar o efeito disciplinador da fiscalização, nomeadamente através da "minimização do tempo decorrido entre a infracção e a sanção".
A divisão de competências, com a consequente separação dos sistemas informáticos, está a criar dúvidas sobre a coordenação entre os mesmos. É que a ANSR ficou com as contra-ordenações de trânsito e o IMTT com o sistema informático do condutor, sem que se saiba como se faz a ligação entre os dois, segundo relatos que chegaram ao PÚBLICO.
As próprias forças de segurança não sabem informar com certeza onde o condutor se deve dirigir para levantar uma carta de condução depois de cumprida uma sanção de inibição de conduzir. É que, para colmatar a falta de delegações regionais, foram criados postos de atendimento nos governos civis. A ANSR confirma que estes postos são meros intermediários.
O acumular dos processos não é alheio à gestão dos trabalhadores da ex-DGV. Neste organismo extinto há 50 funcionários, entre juristas e administrativos, que foram notificados para integrarem a mobilidade especial, segundo o Sindicato dos Trabalhadores da Administração Pública (Sintap).
"É um processo que ninguém entende. O serviço [o IMTT] diz que precisa das pessoas, mas elas têm que ir para a mobilidade especial", afirma José Abraão, do Sintap, que promete avançar com providências cautelares sobre estes casos.
Paulo Trindade, da Federação Nacional dos Sindicatos da Função Pública, diz ter sido informado pelo anterior secretário de Estado da Protecção Civil, Ascenso Simões, que cerca de 140 trabalhadores da ex-DGV afectos a contra-ordenações seriam colocados em mobilidade especial.
Contactado pelo PÚBLICO, o IMTT confirma, numa nota escrita, que recorre aos programas ocupacionais e empresas privadas de outsourcing, lembrando que eram "práticas correntes" nos antigos organismos.

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